quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Escola Municipal de Dança estreia “Modupe”


A força que nunca seca

Escola Municipal de Dança estreia “Modupe”, espetáculo que investiga as raízes africanas da cultura brasileira

Foto Renato Forin
Na tradição africana, “modupe” é uma expressão de gratidão e seu frequente uso demonstra uma reverência humilde por parte desse povo. Associada a Deus, além de um agradecimento, “modupe” também passa a ser uma felicitação. Quem diz “Olorum modupe” dirige um “muito obrigado” à divindade e deseja felicidade ao próximo.

O duplo sentido do termo yorubá viajou um oceano inteiro nos porões dos navios, resistiu ao tempo e à distância, e veio habitar os sentimentos de 17 jovens bailarinos e um coreógrafo da Escola Municipal de Dança de Londrina. Eles estreiam a montagem “Modupe” dentro da programação do Festival 2012 nesta quarta (10), às 20h30, no Circo Funcart.

Foto Renato Forin
O espetáculo é um retrato em movimento do DNA brasileiro e das manifestações populares. Esta é a primeira vez que o grupo apresenta seu trabalho de estreia, originado há dois anos de uma pesquisa sobre as heranças africanas por parte dos alunos e do diretor Alexandro Micale. “Os bailarinos adoram vasculhar esse universo. Você tem que gostar do Brasil para conseguir fascinar o outro. Ninguém no mundo se mexe como o brasileiro e quisemos mostrar isso nas coreografias”, aponta Micale.

O sangue negro que regou nossas veias ainda corre, afinal, como rios que fertilizam porções áridas de um Brasil profundo. O diretor Alexandro Micale decanta a África que mora no país e desenha uma coreografia que transforma movimentos cotidianos em dança contemporânea. Lá estão, de modo estilizado, os quadris sinuosos das mulatas que sobem-descem o morro, a célere acrobacia dos meninos que dançam capoeira, o transe físico dos filhos-de-santo e dos devotos, a malemolência dos foliões que se entregam nas festas populares.

Na comunhão Brasil-África, o Nordeste vem à tona e traz consigo dualidades típicas da nação: a riqueza e a miséria, a força e a suavidade, a preguiça e a disposição. “Apesar de toda alegria, a vida no Nordeste não é tão fácil assim”, diz o diretor, que traduz essas referências com movimentos predominantemente em quartetos e em grupos maiores, criando impactantes desenhos cênicos.

A execução das performances exigiu dos bailarinos entendimento dos contextos. “Conversei muito com eles porque preciso de um peso cênico muito grande. Se não tivermos na cabeça o que queremos, não vai chegar nas pessoas do público. Nós conversamos muito sobre a intenção dos movimentos, a qualidade de cada gesto”, destaca Micale.

O resultado é nítido. O espetáculo tem um enredo coreográfico que encontra eco na dramaturgia composta por canções brasileiras intercaladas por timbres instrumentais (como atabaques, berimbaus e pífanos). Daí, aparecem abstratamente personagens como quebradeiras de coco, moleques famintos, curumins, tainás.

Em determinado momento, a voz de Maria Bethânia entoa “olha, eu não sou daqui / Marinheiro só” (Caetano Veloso, com versos de domínio público), para a qual Maria Rita responde “eu não sou daqui também, marinheiro / Mas eu venho de longe” (Marcelo Camelo). É o mote para que se lancem no palco movimentos que remetem aos amores e às saudades das mulheres que ficam no porto, das esposas que aguardam seus pescadores na praia. Em outros instantes, explodem as festas e a religiosidade brasileira, entre santos católicos e nagôs.

A energia com que o grupo rasga o palco vai além - extravasa a boca de cena, roça a pele do público, leva à compreensão de um país que não está nos livros, nos gabinetes, nas instituições. País que aparece - como cantam os versos de Roque Ferreira (integrante da trilha sonora) - “lá no interior”, onde “tem uma coisa que não tem nome”, mas que se mostra clarividente à luz do refletor.

 Trajetória – Os integrantes do grupo da Escola Municipal de Dança de Londrina são, em sua maioria, da Zona Norte da cidade, onde fica uma das sedes da instituição. Segundo Alexandro Micale, as ideias para a montagem foram surgindo progressivamente.

Após cinco anos de estudos com o balé clássico, os alunos começavam a dar novos passos. “Eles sentiam que precisavam se mexer de outras formas e começamos a brincar, a propor movimentos depois da aula de clássico”, conta o diretor.

As práticas cresceram e tomaram forma de espetáculo. Durante o processo, Micale destaca o empenho não só dos integrantes do grupo, mas também das mães, que se engajaram na campanha com o objetivo de levantar fundos para a produção. Na Mostra Local do Festival de Dança 2011, o grupo chegou a apresentar um fragmento do que viria a se tornar “Modupe”, que estreia agora com duração de 45 minutos.


Renato Forin Jr. / Assessoria de Imprensa Festival


Serviço:

Modupe
Escola Municipal de Dança – Londrina (PR)

10/out. (quarta)
20h30
Circo Funcart
45 minutos
Classificação indicativa: livre
R$ 10,00 e R$ 5,00

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