sexta-feira, 14 de novembro de 2014

Época de ouro do teatro londrinense

Escola Municipal de Teatro comemora os 80 anos de Londrina com a remontagem de duas peças históricas do Grupo Proteu

            O Grupo Proteu, criado por Nitis Jacon em 1978, foi um dos protagonistas do movimento teatral que colocou Londrina em posição de destaque no cenário nacional das artes cênicas. Com montagens emblemáticas ao longo de mais de duas décadas, a trupe pé-vermelha ficou conhecida pela ousadia e inventividade nos palcos, inclusive nos anos sombrios da ditadura militar. Duas dramaturgias do Proteu, assinadas por Nitis, voltam à cena a partir deste fim de semana por iniciativa da Escola Municipal de Teatro.

            A peça de rua “Terra do Nunca” será encenada neste domingo (16/nov), às 17 horas, no pátio externo da Funcart (Rua Senador Souza Naves, 2380), com entrada gratuita. Já “Bodas de Café” estreia na segunda-feira (17) e segue temporada ininterrupta até o dia 25 de novembro, sempre às 20h30, no Circo Funcart. Os ingressos custam R$10 e R$5 (meia). Os dois espetáculos foram remontados em comemoração aos 80 anos da cidade. O projeto conta com patrocínio do Promic, Programa Municipal de Incentivo à Cultura.

            A escolha dos dois textos no vasto repertório do Proteu não foi fortuita. Ambos trazem um retrato sócio-histórico de Londrina e permanecem atuais, sobretudo pela inteligência, pelo humor ácido e pela construção poética. Enquanto “Terra do Nunca”, da década de 90, investiga a realidade dos meninos de rua que perambulam pela cidade, viciados em drogas, “Bodas de Café” conta a trajetória de Londrina a partir da ótica de personagens reais e à margem da história oficial. Este último foi montado por Nitis originalmente em 1984 como parte das comemorações do aniversário de 50 anos de Londrina.

            As remontagens pela EMT têm coordenação de Silvio Ribeiro e contam com a participação de 37 atores, entre formandos e alunos da Funcart. “Escolhemos peças que falam de personagens que corriam o risco de ficarem esquecidos se não fosse o trabalho do Proteu. Quando assisti a ‘Bodas’ pela primeira vez foi que comecei a me sentir realmente de Londrina, porque era uma história bonita, interessante, séria. Nitis foi, para mim, uma escola e por isso é um desafio e uma honra prestar esta homenagem”, afirma Silvio.

Desde o início do ano, o grupo mergulhou na história do Proteu e no antigo processo de construção dos espetáculos. Assistiram a vídeos da época, tiveram acesso a fotos e a programas originais e contaram com a colaboração de atores do grupo de Nitis, que conduziram bate-papos e acompanharam alguns ensaios. Dentre eles, Josy Galvão, Remir Trautwein, Poka Marques, Zeca Cenovicz, Emilia Myiazaki e Cláudio Rodrigues, que assina a produção executiva das duas remontagens e a assistência de direção de “Terra do Nunca”.

“O projeto é uma linda homenagem e as peças são muito atuais. É emocionante ver como estes jovens atores embarcaram neste sonho” comenta Cláudio Rodrigues. Ele – que permaneceu no Proteu de 1979 a 2002 – recorda os processos colaborativos do grupo e os ensaios no Teatro Ouro Verde madrugada a dentro. “Lembro que o ‘Bodas de Café’ teve uma passagem para os censores da ditadura assistirem. Eles riscavam trechos do texto, mas, mesmo assim, depois, a gente tinha coragem de falar em cena. Muita gente saía incomodada com a peça porque era uma coisa real. Em ‘Terra do Nunca’ também colocávamos o dedo na ferida ao abordar a questão das drogas”.

Bodas de Café – O texto de “Bodas de Café” que foi utilizado pela EMT é datilografado e ainda traz os carimbos da censura em algumas páginas. Com o raro material em mãos, as diretoras Carol Ribeiro e Simone Andrade buscaram o máximo de fidelidade à encenação original, adaptando apenas gírias e expressões da época. A peça conta a formação e transformação de Londrina desde a década de 1930 até os anos 80 por uma perspectiva muito particular: a de personagens ocultos, como os lavradores, as prostitutas e os imigrantes. Todas essas figuram existiram na realidade e muitas estavam na plateia na estreia em 1984.


“O texto é uma obra-prima, com posicionamento política e inteligência teatral. Ele explora muito a metalinguagem, mostra os atores pesquisando e traz a figura do ator-coringa, que vai se transformando nos personagens”, explica Carol Ribeiro. A montagem da Escola também optou pela exposição dos processos. No palco, há apenas objetos cênicos, como escadas, cordas e araras de figurinos. A trupe constrói aos poucos os espaços e as caracterizações. A iluminação trabalha com escalas cromáticas que vão dos tons monocromáticos de 30, passando pelo sépia, até o colorido dos anos 70.

Terra do Nunca – Na década de 90, o Bosque de Londrina era o principal reduto de meninos e meninas que cheiravam cola, droga da moda. Sensíveis às condições miseráveis destes adolescentes, Nitis Jacon e a atriz Maria Fernanda Coelho elaboraram uma releitura da narrativa de Peter Pan, ambientando todos os personagens naquele contexto marginal. O Proteu levou o espetáculo justamente ao Bosque. Na remontagem, Silvio Ribeiro mantém a cola como metáfora para todos os entorpecentes, principalmente o crack, que continua vitimando jovens.


Em uma das viagens alucinógenas, os personagens embarcam para a “Terra do Nunca”, um lugar de fantasias e ilusões, que disfarçam a fome e a realidade perversa. Sininho é uma prostituta; Capitão Gancho é um bêbado valente; Wendy é a moça idealizada em quem os meninos depositam todas as suas carências. Cenas de confronto com a polícia e de profissionais ‘bem-intencionados’ que abordam os usuários de drogas conferem o tom crítico da montagem.

Silvio Ribeiro - que assinava a música da montagem original, junto de Simone Mazzer e de Mário Fragoso - conta que o espetáculo teve um grande impacto sobre ele na época. “A peça expõe de maneira muito crua e difícil a condição dos meninos de rua. Fiquei tomado por aquilo, parei com o teatro uma época e decidi fazer um trabalho social no Acalon Escola-Oficina (projeto que atendia crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social), onde permaneci por dez anos”, comenta.

Após a apresentação de domingo na Funcart, “Terra do Nunca” circula por espaços abertos, por escolas e por outras instituições. No dia 28 de novembro, o espetáculo será encenado às 10 horas no Convento das Irmãs de Santa Ana (Jardim Monte Belo). No dia 29, ao meio-dia, chega ao Calçadão de Londrina.
Renato Forin Jr. (assessoria de imprensa)

Serviço:
Bodas de Café
De 17 a 25 de novembro
Às 20h30
No Circo Funcart
(Rua Senador Souza Naves, 2380)
Ingressos a R$10 e R$5
Classificação indicativa: 16 anos

Terra do Nunca
Dia 16 de novembro (domingo)
Às 17 horas
No pátio externo da Funcart
(Rua Senador Souza naves, 2380)
Gratuito
Classificação indicativa: Livre

Informações: (43) 3342-2362

Nenhum comentário:

Postar um comentário